19.10.06

Do temp..!

Esses dias vim a reencontrar um amigo que não via há muitos anos. Andávamos em direções opostas, mas não o tinha visto, e quando olhei para o lado para atravessar a rua tomei um susto diante do sorriso dele, agradável como sempre fora. Amigo de infância, sabe, daqueles que brinca de boneca com você, acha aquela peça de Lego que faltava - ou esconde aquela outra do quebra-cabeças que te ocupou a tarde toda pra montar.
É engraçado ficar lembrando essas coisas de criança. Ele me falou dos últimos anos, falou durante quase todo o tempo em que andamos até o estacionamento. Me contou das pessoas que encontrara, dos lugares para onde fora - praticamente o mundo todo -, das coisas bonitas que vira, das coisas erradas que não fizera, falou do colégio, dos pais e dos avós, dos livros e dos discos, das casas e dos carros - e falou até de futebol, natação e ballet.
Já na porta do carro, me deu outro sorriso de criança e perguntou o "e você?" mais interessado que eu ouvira nos últimos 15 anos.
- Trabalhando, trabalhando, lendo um ou outro livro por aí - falei, sem ânimo e já desligando o alarme - sabe como é, parece que os dias estão cada vez mais curtos - destrancando a porta -, a gente parece que vive uma semana em uma vida.
Ele segurou a porta do carro e ficou esperando que eu falasse mais. Mas quando a gente mata a criança que vive dentro dos nossos olhos e brinca com os nossos sorrisos, não há muito mais a contar além do quanto se tem trabalhado, de como os preços subiram e de como este inverno está mais quente que o último - apesar de que nem tivemos tempo para notar ou recordar o frio ou o calor do último inverno.
Parecia que ele ia me perguntar por que eu estava triste, parecia que ia me dizer que tudo ia ficar bem. Parecia que ele ia tirar um chocolate do bolso, quebrá-lo ao meio e me dar a maior metade.
Mas aí ele desapareceu.
Parecia que me dissera tudo sobre o que o eu não sabia. Parecia que tivera repetido o que me dizia na infância: "as coisas importantes na vida são invisíveis aos olhos".
E meu amigo imaginário desapareceu. Deixou comigo a criança interior que eu há tempos deixara em coma numa UTI adulta demais para salvá-la.
E a lua naquela noite estava mais bonita do que eu me lembrava de ela ter estado nos últimos 15 anos...
Aug.8th.2006

Nenhum comentário: