25.2.04

Gentil

Tinha um olhar vago, olhos sempre distantes. Quando sorria, dava a impressão de estar sendo gentil; nunca ria. Vez por outra, balançava a cabeça em acordo ou oposição; erguia as sobrancelhas freqüentemente. Sempre cumprimentava a todos do departamento, mantinha a mesa em ordem, não deixava mensagens esperando na caixa de entrada.
Sabia-se que falava bem, embora fosse de poucas palavras. Os seus eram os melhores artigos; seu teclado era silencioso, mais que a boca. Não lhe tinham inveja, quase ninguém; não há como escapar de um ou outro. Habitualmente, limitavam-se a dar os parabéns por mais um recorde de acessos: e receber o já conhecido sorriso-gentil. Sempre gentil.
O que mais espantou a todos foi o requinte cruel de escrever a carta com seu próprio sangue e descrever, de forma sádica, como estava a se cortar e como era se sentir sangrar até a morte. E, te vejo em breve, foi como assinou. Dizem.

23/Set/2003